quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Por quê eu desisti de servir os pobres


Quem me conhece e sabe de toda minha trajetória de vida deve achar no mínimo curioso o título acima. Minha família tem como referência central as figuras de meu avô e minha avó paternos que foram fundadores do Exército da Salvação no Brasil. Vidas dedicadas a mendigos, prostitutas, e de maneira especial aos orfãos, enfermos e renegados. Minha paixão adolescente se viu conquistada por lutas contra a pobreza, a fome e a injustiça e desde quando me casei, há 25 anos atrás, estive envolvido com servir em favelas, a estudantes pobres, populações carentes, mendigos, bairros periféricos, desempregados e pessoas sem renda. Tenho no currículo o fato de ter ajudado a gerar renda, facilitar a organização de famílias, feito pontes entre ricos e pobres, alimentado pessoas e dado a oportunidade de que outros descobrissem profissões, estudassem e transformassem seu futuro. “Empoderar” as pessoas, foi um dia um dos pontos chave de minha prática de não criar dependência. Depois de tudo isso, sou chamado a questionar toda a vida e a desistir de servir aos pobres.

Ao longo da vida guardo o hábito de sempre perguntar se o que estou fazendo tem sentido, se diante de meu Senhor e Deus estou com meu coração alinhado à Sua vontade, se não estou errando o alvo. Sigo com disciplina a regra dos três “por quês”, que pergunta a cada resposta dada o tipo de pergunta que só as crianças sabem fazer e que me auxilia a gerar um vetor de mudança permanente, de auto-crítica e de realinhamentos pessoais. Assim, a cada etapa, ao fazer cada coisa pergunto: Por quê? E qualquer que seja a resposta, a ela de novo pergunto: Por quê? Me sinto no caminho quando aquilo que faço ultrapassar o terceiro por quê, e daí sigo adiante.

Já faz algum tempo me pus a refletir sobre a vida de Jesus, sobre o princípio da Kenosis, ou esvaziamento, baseado no texto de Filipenses 2:1-11, sobre a encarnação de Jesus na realidade e sobre os inúmeros contatos e conversas dele com gente tão miserável como os leprosos e tão ricas como publicanos, chefes de sinagoga e príncipes de seu povo; com famílias da classe média, com proprietários e com servos e mendigos. Sobre o que ele via e como agia. E tudo isso foi crescendo e me fazendo pensar no texto de Mateus 5, de ele dizer aos pobres que mantivessem suas vidas no caminho e animados por serem pobres, por que deles era a possibilidade de terem a vida dirigida e controlada por Deus e perceberem Sua boa e perfeita vontade.

Devagar, nos últimos anos, além da reflexão bíblica, tenho observado o quanto vários amigos extremamente sinceros vem e vão, se empolgam e começam a servir e logo se ocupam de volta com seus afazeres e preocupações. Vejo também com que freqüência alguns outros pagam para que alguém cumpra o serviço de Deus e fazem isso por tempos determinados e movidos da maior das sinceridades, ainda que de longe e sem envolvimento pessoal.

De uma outra perspectiva observo o quanto a pobreza se entranha na vida dos pobres, e quanto esta somente revela muitas vezes seu desejo mal sucedido de possuir, de ter acesso ao consumo destruidor de tudo, de como sua situação se constrói pela sedução das mesmas coisas que seduzem e destroem os ricos. O mesmo individualismo, o mesmo egoísmo, a mesma tendência a sentir-se confortável e identificado com a posse das coisas. E a adesão inegociável a um estilo de vida e modo de pensar que os prende ao mito da necessidade moderna, ao desejo mítico de evoluir e à submissão ao mito do desenvolvimento.

Igualmente a ricos, pobres e remediados, o mesmo convencimento de que o que precisam é de algo que o mercado, o dinheiro, o governo ou alguma agência pode lhes oferecer. Que serão felizes com a posse, com a pança cheia (uns com pão, outros com brioches) e com o fluir permanente do dinheiro que tudo pode e tudo resolve. E dentre estes, alguns bem intencionados estendem a mão para “incluir” outros no estilo de vida ou no patamar que alcançaram. À mão estendida de cima para baixo, chamamos serviço.

Descobri ao longo dos anos que a própria posição de servir aos pobres, de compromisso com a libertação, estava cheia de superioridade, daquele tipo de superioridade que se traduz por dar ao outro o que eu tenho, uma vez que sutilmente assumo com meus atos que o que eu tenho ou faço era o que ele deveria ter ou fazer, uma tradução percebida na sutil arrogância das tais políticas de “inclusão”, sempre buscando colocar o outro dentro da caixa onde vivo, incluído no meu estilo de vida.

Tudo isso foi me levando a desistir de servir os pobres. Ainda que nem de longe me alinhando com aqueles que a este ponto, do alto de sua riqueza, conforto e bem estar possam estar dizendo “ta vendo? É isso que eu sempre pensei.” Lamento informar a estes que nem de longe creio em seu estilo de vida separado do contato com o pobre, com o desvalido, o faminto, o nu, o feio, o mal cheiroso, o inculto e o bárbaro. Não me alinho com aqueles que pagam seus impostos ou contribuem para caridade dizendo assim estar cumprindo seu papel. Não é disso que falo. A estes continuo retransmitindo a mensagem de Jesus, confrontadora de seu estilo de vida cego, insensível e arrogante, uma mensagem que chama de loucura aquilo que estes chamam de segurança.

Desisti de servir os pobres por outra razão.

Desde 1993, quando saí para as ruas com um bando de meninos e meninas na direção das populações de rua, havia desenvolvido uma mística de, a cada saída nas noites frias de minha cidade, não ir encontrar mendigos, ou carentes. Sempre dizia aos garotos àquela época que eu nunca me disporia a servir pão a um mendigo, ou fazer-lhe a cama, ou vestir sua nudez. Nosso moto, naquele tempo, era “encontrando Jesus na pessoa do pobre mais pobre”. Servir, alimentar e vestir Jesus era nossa motivação, isso sim me animava. E descobrimos com aquelas saídas, que a cada encontro desse com um Jesus assim disfarçado, que os chamados miseráveis se transformavam em mestres, em denunciadores de nossa miséria pessoal, de desmascaradores de nossos mecanismos de manipulação e nos víamos, de repente, espelhados neles, usando as mesmas desculpas, mentiras e escaramuças para ter o que queríamos. Talvez com um pouco mais de sucesso, e certamente simplesmente com mais sorte social, e mecanismos de segurança. Mas descobrimos à época, que nós éramos eles.

Aqueles que se descobriram assim, se libertaram, cresceram e mudaram. Confrontados por Jesus e ensinados por ele no contato com suas próprias pobrezas e misérias, descobrimos, muitos de nós, o que eram boas novas. Naquele tempo, e daquele tempo, muitos fomos transformados pelo toque de Jesus e pela boa nova que ele nos tinha a transmitir como pobres que nos descobrimos.

No entanto, nem sempre esta mística foi mantida como chama acesa, voltei tantas vezes a servir aos pobres, a me deixar levar pela possibilidade de estar na posição de ajudador e fui me esquecendo muitas vezes de minha própria miséria.

Como disse acima, ficar longe dos pobres e julgar suas atitudes e descaminhos do alto do conforto de minha posição social superior não é a alternativa que exponho aqui. Ajudar os pobres, conscientiza-los e inclui-los se mostra um mito, mais um daqueles nascidos no desenvolvimentismo dos últimos 60 anos. A alternativa que apresento é outra, traduzida no encontro, no reconhecimento e na identificação.

Desisti de ajudar os pobres, de servi-los e de salva-los. E isso porque tenho re-descoberto uma verdade dura: a de que Jesus não tem nenhuma boa notícia para quem serve os pobres. Jesus não veio trazer boas notícias a quem serve os pobres, ele trouxe uma boa notícia aos pobres. Ele não tem nada a dizer a outros salvadores, a quem disputa com Ele o cargo de Messias, de Redentor. A agenda de Jesus só traz uma mensagem aos que se reconhecem pobres, nus, feridos, cansados, sobrecarregados, carentes e sem esperança. Aos demais, sua agenda tem pouco ou nada a oferecer

A única maneira de permanecer com os pobres é se descobrimos que somos nós mesmos os miseráveis, é se reconhecemos a nós mesmos, ainda que bem disfarçados, naquele que está diante de nossos olhos. Ao encontrarmos neles nossa miséria, ao nos dar-mos conta de nossa carência, da desesperada necessidade de sermos salvos, ai nos encontramos com a agenda de Jesus.

Deus não se apresenta em nossa capacidade de curar, mas em nossa necessidade de sermos curados. Descobrir esta nossa fraqueza nos coloca sem nada para oferecer, servir, doar, mas revela nossa necessidade de sermos amados, curados e restaurados.

Por ai é que faz sentido que o poder que existe em nós não é o poder de nossas capacidades e riqueza, mas o poder residente em nossa miséria pessoal, tão bem escondida e disfarçada em nossas posses e estabilidade. Como diz Jean Vanier em um livro que li recentemente: “Somos chamados a descobrir que Deus pode trazer paz, compaixão e amor através de nossas feridas”

Como passou a fazer sentido o texto que fala do Messias, e que diz: pelas suas pisaduras, fomos sarados. Os demais messias tendem a escapar do exemplo de Jesus de esvaziar-se a tal ponto de ser um de nós, de morrer conosco e de abrir assim a porta da ressurreição para nós.

O poder que Jesus usou para nos curar e continuar curando não reside em seu acesso ao poder universal, mas em sua identificação conosco na cruz. Em se abrir em chagas e feridas, em se tornar um de nós, em viver nossa vida.

Desisti de servir aos pobres. Estou voltando a encontrar os pobres e me encontrar neles. Voltei a descobrir a miséria que se esconde nas vidas bem montadas de nossa falsa segurança. E com isso posso entender o Jesus que fala com leprosos e com ricos homens de negócios, com cobradores de impostos em suas festas e com enfermos miseráveis. Em sua identificação com todos e cada um Ele via o que talvez mais ninguém via: a extrema miséria e pobreza da condição humana, independente de qualquer status ou roupagem social.

Passei a reencontrar minha pobreza, a me ver em cada situação de miséria, e de me colocar em contato com minhas dores internas. Dali clamar por cura, libertação, comunidade e amor. Pedir misericórdia e ser restaurado.

Quem serve, serve de cima, Jesus nos chama a encarnar a nos vermos no outro e a nos colocarmos por baixo. A deixar de confiar em nossa capacidade e mudar o rumo para irmos ao encontro de nossas feridas e dores. De lá descobrir o poder que existe em sermos menos e não mais.

Desisti de servir aos pobres. Voltei a descobrir minha pobreza. E com ela posso clamar: “Filho de Davi, tem misericórdia de mim”

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Uma falsa economia do conhecimento

Existem textos que ao serem lidos mesclam em nós um sentimento de inveja e admiração, e quem sabe até um pouco de raiva. Explico: São textos que expressam algo que conhecemos, do que falamos e que nos enchem as conversas, que falam nossa lingua e expressam em poucas linhas o que levamos horas falando. Dá uma inveja danada de ter escrito aquilo, uma admiração profunda de encontrar alguém que fala a mesma coisa que a gente de maneira mais clara e até uma certa raiva de não termos feito o mesmo.
Com este formato, eis ai um texto que apareceu na edição do "The Guardian" de ontem, 04 de agosto de 2009, e escrito pelo articulista Jeremy Seabrook e que pode ser lido no original clicando aqui.
Eu traduzi o texto e decidi compartilhar com meus amigos. Talvez eu ainda publique algumas impressões pessoais ao final hoje ou amanhã.
Com vocês o texto, que como diz meu recente amigo Paulo Brabo, é uma "goiaba roubada" do quintal de um belo vizinho:

"Uma Falsa Economia do Conhecimento

A minuciosa divisão de trabalho em uma economia de mercado afasta-nos de nossas competências e as vende de volta para nós.

Jeremy Seabrook

guardian.co.uk, Terça-Feira 4 de Agosto de 2009 18.30 BST

A divisão do trabalho nas sociedades ricas é tão minuciosa e particular que o conhecimento especializado de um indivíduo é muitas vezes hermeticamente separado do de outras pessoas. “Não é o meu domínio. Eu não sou um perito. Eu não tenho conhecimento sobre esse período. Isso não é responsabilidade minha. Não é o meu departamento. Eu não sei nada sobre isso.” Estas são algumas das frases com que as pessoas explicam um estreitamento da apreensão do mundo.

Como conseqüência muitas competências humanas básicas comuns se perdem. Uma concentração sobre a especificidade é acompanhada pela perda de outras formas de conhecimento, que chegam a parecer arcaicas no mundo moderno. Abandonar habilidades básicas pode parecer libertação, especialmente a princípio - esquecer de como cultivar, ou mesmo como preparar, a nossa própria comida, como fazer roupas simples, como prover-nos de abrigo: transferir essas tarefas para os outros é colocar de lado um grande fardo.

Mas, uma vez perdidas, estas simples realizações se tornam irrecuperáveis; e mais, preciosas capacidades humanas também entram em decadência e se trasformam no trabalho de alguém: saber o que fazer em tempos de necessidade, de doença e de morte, como se comportar diante do sofrimento; mas também como celebrar nossas próprias vidas através de nossas próprias histórias, canções e poesia - tudo isso é executado no interesse de uma cada vez mais elaborada fragmentação da função social.

Isto dá uma idéia de por que há muito debate sobre se uma nova geração está se tornando mais esperta ou menos instruídas do que aqueles que existiram antes deles. Por um lado, existe uma subcultura rasa, simplificadora, com a perda de habilidades anteriormente tidas como certas, que corta o conhecimento da história e da literatura; por outro, melhoria nos resultados de exames, um maior "estado de percepção", diferentes formas de consciência, a aquisição de novas competências - a coordenação mão-olho dos jogos de computador, a destreza e a acuidade da juventude. O argumento é inconclusivo. Talvez, naquilo que parece uma contradição, ambas as partes contêm uma certa medida de verdade, e os jovens podem tornar-se simultaneamente mais e menos capazes.

A única coisa que você precisa saber em sociedades" avançadas" ou "desenvolvidas" que vivem espasmos de perpétua reforma e modernização é a forma de obter, adquirir, ganhar ou fazer dinheiro, porque com isso você pode ter tudo. A série de verbos é significativa, pois abrange tanto modos lícitos e ilícitos de lidar com a questão. Uma vez que a grande maioria de nós dependemos de um salário ou de vencimentos para maximizar a receita, temos de saber bem alguma coisa sobre algo. No entanto, na aquisição e intensificação do conhecimento específico, o mais provável se torna que o domínio de outras capacidades irá afundar no esquecimento. A complexidade da divisão do trabalho é acompanhada por uma redução nas áreas de competência ativa.

Esta é a forma como o dinheiro tanto habilita quanto desabilita: ele nos permite comprar tudo o que for necessário para uma vida plena e criativa, mas também nos divorcia cada vez mais do que Ivan Illich chamou de "nossa capacidade inata de curar, consolar, se emocionar, aprender, construir nossas casas e enterrar os nossos mortos "; o trabalho daqueles que agora servem nossas necessidades já foi um dia uma propriedade comum, mas são agora qualificações profissionais ciosamente guardadas. Desta forma, a ignorância coexiste com conhecimentos altamente especializados. Num certo sentido, somos todos sub-contratantes existenciais, como a personagem do drama de Villiers de l'Isle Adam, Axel, que disse: "Para viver a vida, nossos servos farão tudo isso por nós".

Este mecanismo econômico e social é por si só gerador da real dependência cultural. É frágil e facilmente perturbado: tudo que se precisa para jogá-lo na desordem é uma greve de entregas aos supermercados, uma interrupção no sistema de energia, uma calamidade natural que bloqueie o delicado - e ao mesmo tempo pesado - processo pelo qual o pão nosso de cada dia vem a nós. A imagem de prateleiras vazias em supermercados, uma ruptura no fornecimento a gasolina, uma tela de TV em branco, são assustadores lembretes da nossa dependência de um sistema que toma de nós tanto quanto, ou mais, que os rendimentos, mas que deve ser mantido a qualquer curso custo.

Esta subordinação é o oposto das liberdades das quais a nossa sociedade supõe ser a suprema encarnação. A escolha, a democracia e a liberdade de que desfrutamos são altamente subordinadas ao interesse de outros; mas estas desaparecem facilmente, uma vez que o nosso objetivo social e econômico se separe dos deles - as nossas próprias necessidades são enfatizadas, a nossa própria indispensabilidade na estrutura de trabalho e, acima de tudo, o mais privado de todos os nossos relacionamentos (não mais o amor ou mesmo sexo): a secreta, sagrada comunhão que subsiste entre nós e o nosso dinheiro.

Fora da nossa própria esfera de conhecimento, somos uma nação de incompetentes banhados a ouro, pois no mundo desconhecido da perícia de outras pessoas, tateamos na ignorância e no desamparo.

Isto é o que o fenômeno aparentemente benigno da "economia de mercado" realmente significa. Por seu crescimento e expansão, ela pode se apropriar de mais áreas da proficiência humana, reformula-las e vende-las de volta. Isto envolve uma implacável garimpagem, não tanto das necessidades humanas, mas acima de tudo das competências humanas. Ela nos rouba habilidades e os resultados desse roubo de coisas miúdas são vendidos em uma nova forma. Se estamos constantemente fascinados por quaisquer novidades que aparecem à venda nas vitrines do mundo, isto acontece porque, muitas vezes, eles encarnam a predação de incursões relâmpago em nossos recursos internos, e na verdade, são um paralelo da pilhagem dos recursos materiais homólogos. Comprar, neste contexto, torna-se não tanto um vício ou uma terapia mas um esforço desesperado para tentar recuperar a perda de algumas capacidades e aptidões através da conjuração e invocação do poder do dinheiro.

É um truísmo dizer que nos ocupamos agora de uma "economia do conhecimento". Isso é um termo ambíguo, pois que sugere também uma economia de conhecimento, aquele tipo de frugalidade que o torna uma mercadoria escassa, uma pela qual nós pagamos muito caro e duplamente, uma vez que não somente ela foi removida de nossas mãos, cabeças e corações, mas também por que ela só pode ser recuperada pagando (caro) por isso. Não é, como afirmam alguns moralistas, que "necessidades artificiais" ou desnecessárias são criadas pelo consumismo e pelo crescimento do mercado. Antes é, sim, que algo indispensável tem sido permanentemente usurpado, o qual nunca poderá ser adequadamente compensado pelo regime de resgate por meio do comércio varejista global, uma vez que permanece inerte -capturado e armazenado – no crescente conjunto de coisas à disposição diante de nós. Se tais produtos e serviços nos seduzem e encantam, é porque eles um dia nos pertenceram."


quinta-feira, 23 de julho de 2009

Crente não...

Eu não sei se você já se viu em uma situação na qual parecesse que a única pessoa lúcida presente fosse precisamente você.

São situações que ocorrem muito raramente, quando em uma festa em que todos estão bêbados e somente você bebeu guaraná e água mineral; ou em uma reunião onde todo mundo está alto de tanta maconha e você o único que não fumou; ou quando em visita a um hospício, fecharam a porta e você ficou para trás com um bando de Napoleões, deuses e filhos deles.

Em qualquer dessas situações o incômodo é bastante grande e pode-se chegar à conclusão de que quem está fora de si é você.

Viajando com a família, de férias pelo Nordeste, eu e minha esposa começamos a ter a mesma sensação vendo a febre de consumo ao nosso redor, a comilança de coisas desnecessárias, as compras de bugigangas e produtos “artesanais”, feitos em série do outro lado da calçada. A obesidade enferma se tornando a regra - da qual um dia eu fui vítima e ainda trago marcas indeléveis no meu corpo, que me ajudam a lembrar o quanto meu telhado é de vidro - e a fome dos que servem e que tudo fariam para serem os gordos servidos. Em todos os envolvidos nesse teatro de horrores, o entorpecimento parece a regra, e isso me fez pensar e registrar algumas impressões.

Eu cresci crente, fui jovem crente e me casei crente. E isso queria dizer algumas coisas contra as quais minha geração acabou se rebelando: Crente não bebe, crente não fuma, crente não dança, crente não transa, crente não reage, crente não desobedece, crente não rouba, crente não mente... e mais um monte de coisas que a palavra crente trazia junto consigo.

Hoje faz parte do senso comum, e do bom senso, a noção de que beber demais faz mal, que o fumo mata, que diversão demais aliena, que sexo e amor andam juntos, que a não violência é melhor, que ética é melhor que jeitinho e que verdade é melhor que mentira. Mesmo em uma sociedade de bêbados, fumantes, alienados, devassos, violentos, mentirosos, corruptos, ladrões e desobedientes como a nossa, ficou lugar-comum saber que tudo isso não presta. Vidas simples e regradas deixaram de ser privilégio dos “crentes” e na verdade passaram a ser muitas vezes menos vistas entre os tais como era possível se verificar antigamente.

Sempre me deixou encafifado saber a origem de tais práticas e o que elas teriam a ver com a gente nos dias de hoje.

Uma das ênfases centrais da mensagem do Mestre Jesus foi caracterizada pela expressão “eu porém vos digo”, pela dimensão de uma outra referência ao dizer: “meu reino não é deste mundo”, ou “não seja assim entre vocês” e ainda a recomendação de seguir uma justiça que excedesse a dos legalistas e do direito acadêmico, traduzida pela regra de uma justiça que excedesse a de “escribas e fariseus”. Ao longo dos séculos o mecanismo pelo qual essa dimensão foi vivida sempre tomou o caminho de três passos caracterizados por discernir, julgar e tomar uma atitude decidida em relação àquilo que foi discernido. O que São Tomas de Aquino chama de “Virtude da prudência”.

A primeira coisa que, na minha humilde opinião, os seguidores de Jesus são chamados a discernir é qual seja o “espírito do presente século” ou “Zeitgeist” - nome de um famoso filme atual (e requentado) que muitos gostam de citar – e diante deste espírito saber dar uma resposta, usualmente dialética, contraposta e contra-cultural, que o desnuda, revela sua real identidade.

Cada vez que essa tarefa era cumprida, a comunidade cristã se via diante da necessidade de julgar e, a partir de seu julgamento, dar uma resposta prática que expusesse a farsa, a decadência e a mentira e que apresentasse uma alternativa modelada por outra lealdade, por outro conjunto de valores e a partir daí apresentar um “zeitgeist” alternativo ou ainda melhor, uma ação concreta alternativa.

Foi assim que discernindo o descaso pela vida no Império Romano, cristãos salvavam meninas recém-nascidas deixadas por seus pais para morrer nos lixões da cidade. Em uma igreja que se misturava com a conveniência política, os Pais da igreja foram viver no deserto e no desconforto. Em meio à ignorância e destruição do saber que tomou conta da Europa após a queda do Império, a resposta cristã foram as bibliotecas e os copistas nos mosteiros, diante das cruzadas e da riqueza acumulada, São Francisco se torna o amoroso mendicante que ama os muçulmanos a ponto de servi-los. Em tempos de fé cega, surge São Tomas de Aquino a unir fé e razão.

Se formos às origens da modernidade e da resposta cristã à sua época, vamos encontrar que quando a igreja se tornou poder quase absoluto e imperial, surge um Wycliff e defende a igreja do povo, a Bíblia no lugar da tradição e a pobreza evangélica como padrão. Seguindo a esse momento, quando o clero se fazia ponte entre Deus e os homens e manipulava uma multidão de analfabetos, surge um homem, John Huss, que fez coisas simples como incorporar os acentos ao idioma tcheco, traduzir a Biblia para a língua do povo e defender o sacerdócio universal de todos os crentes. O segundo foi queimado em praça pública, do primeiro, queimaram os ossos depois de morto.

Em um tempo de guerras religiosas, surgem os menonitas que se recusavam a lutar e defendiam a resistência pacífica, a tolerância e a mediação. Em tempos de superstição, surge um doutor Lutero. Quando ser nobre e da elite parecia ser a norma, e as divisões entre os grupos uma regra, surge um Zinzendorf e os morávios optando pelo estilo de vida simples, pelo trabalho duro, pelo valor da mulher e pelo ecumenismo. Quando o mundo se perdia em permissividade e começava a acumular riquezas, surge Wesley e o metodismo, com a proposta de uma vida regrada, disciplinada e de frugalidade, quando o umbigo do mundo era a Europa, ambos os grupos se lançam em missão.

Quando a bebida se tornou uma praga na Europa, a Cruz Azul na Alemanha, os pietistas e neo-pietistas por toda Europa, se tornaram abstêmios. Quando a revolução industrial inundava de imundície, mendicância e exploração os pobres da Inglaterra, surge William Booth e o exército de salvação, comprometidos com as meninas prostituídas, as mães solteiras, os pobres em asilos, com negócios feitos sem exploração de menores e com um mundo sem miséria. Quando o nazismo tomou conta da Alemanha, Bonhoefer funda o seminário alternativo e ilegal de Finkenwald, onde se continuava a luta contra o mal e a ingerência do estado nazista sobre a igreja. Quando negros eram proibidos de andar em igualdade de condições nos ônibus da América, uma simples empregada doméstica cristã, Odessa Cotter, decidiu que crente não andava de ônibus, e começou o boicote que deu espaço para Martin Luther King liderar o movimento negro nos anos 60, que em uma América racista, promovia os boicotes e a luta pela igualdade,e junto com outras forças contraculturais em uma América em guerra, promovia a resistência pacífica e a condenação da guerra do Vietnam. Nas ditaduras da América Latina, Dom Romero morre celebrando uma missa denunciando a carnificina da ditadura de El Salvador, Dom Paulo Evaristo Arns defende presos políticos, Dom Helder Camara luta pelos oprimidos, pelos negros, pelos índios, pela reforma agrária e se recusa a morar no palácio episcopal. Em tudo isso podemos ver que crentes em Cristo souberam dizer: “Crente não alguma coisa” e exibiram uma coragem enorme de andar contra a maré;

Anos depois, infelizmente ninguém bebia, mas não sabia mais que aquela postura foi fruto do amor pelas famílias destruidas pela bebida e não um ato moralista, ninguém festava, mas se esquece que a vida circunspecta era uma reação à devassidão egoísta de um tempo, que a honestidade, a igualdade, e cada um dos nãos seguiam uma longa trajetória histórica, uma resposta ao espírito de cada época, um anúncio de uma outra lealdade. Triste que tudo se perdeu em usos e costumes.

E hoje? Penso que seria hora de começar a dizer com todas as letras: NÃO!

Não mais os nãos que nos tornaram conhecidos como os “crentes”, mas aqueles que poderiam refletir de maneira clara aquele em quem cremos.

Quem sabe fosse o tempo de dizer: Em um mundo bêbado de consumismo que crente não vai a Shopping Center. Em um mundo de música comercial, poderíamos dizer que crente não houve música de gosto duvidoso, principalmente os gêneros “gospelnejo”, “pagodspel” e “Jinglevor”; Diante do absurdo do tráfego, dizer que crente não se rende à industria automobilística, crente não compra a crédito e crente só anda de bicicleta ou a pé; que no absurdo da industria alimentícia crente não vai a supermercado, mas só compra na venda da esquina; que crente não polui; crente não come carne; crente cuida do próprio lixo e não mistura seus dejetos e os guarda em sacola plástica; que crente não come aquilo que vem de fora de sua região e nem o que está fora da estação; que crente não se candidata a nada, mas escolhe a democracia direta e a ação local...

Engraçado que ao dizer tais coisas, o que muitos me dizem é que isso é coisa de radical, que é impossível, que é sair do mundo... pois é... o que devem ter dito os sensatos a cada um dos amigos ai acima?

Bem meu amigo e minha amiga, pode ser que nada disso ai lhe diga respeito, nem lhe toque o coração, nem você ache que é importante. Minha experiência tem sido que a cada tomada de posição como essas e outras do tipo,vejo serem gerados papos interessantes, interações e conversas sobre o dono da vida e vejo o brilho no olhar daqueles que andam com muita saudade d'Ele, mesmo sem saber que é este o sentimento que lhes passa o coração.

Pode ser que você ache que isso não tem nada a ver, que é coisa de maluco, que o insano aqui sou eu e que nada disso fala de evangelho "de verdade". Se for esse o caso, continue sem beber, nem fumar, nem se drogar, nem se alistar, nem votar, nem dançar, mas faça isso em honra àqueles que em suas épocas souberam dar uma resposta ao seu tempo e lugar.

Se o caso for outro, e você vê ai algum sentido mas não sabe o que fazer, e ainda assim gostaria de fazer algo, te dou aqui uma sugestão: faça algo ao alcance das mãos, literalmente. Assuma que crente não usa sacola plástica. Isso qualquer um pode fazer. E faça isso como guardião da criação, como fruto de uma teologia da criação, e não de mero ambientalismo ou de moda do mercado. Os papos e reflexões que surgirão daí te levarão a lugares onde você nunca imaginou se aventurar.

Busque discernir o espírito do presente século, julgue se este se contrapõe ao Espírito de Deus, e se for caso, diga NÃO, mas faça alguma coisa.

Ah... e por acaso, depois de ter sido aquele crente que fui, hoje estou tentando, às vezes com algum sucesso, às vezes deixando a desejar, ser um seguidor de Jesus e viver minha vida em lealdade a Ele. Assim amadureço seguidor, pretendo envelhecer um seguidor e morrer um seguidor, ainda crendo no Meu Senhor.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

O futuro está no passado


Vivemos uma encruzilhada de perplexidade e de pasmo nesse momento da história do ocidente, ou de nosso ocidentalizado planeta. Chegamos mais uma vez, dessa vez de modo mais intenso que nas demais, ao momento de seguir em frente e decidir por uma direção.

Isso não é novo na história humana, muitas vezes já estivemos ai.

Várias dessas vezes, civilizações, povos e nações tomaram o rumo errado que acabou em auto-destruição tragédia, morte e extinção. Culturas se perderam e hoje seus vestígios são motivo de visitas a museus e sítios arqueológicos. Outras, infelizmente em menor número, tomaram direções por vezes menos glamourosas, menos evidentes, mas que lhes permitiu continuar. E mesmo dentro de histórias onde uma segunda chance foi desperdiçada, vemos momentos em que anteriormente se soube mudar a maneira de pensar e mudar a rota de colisão.

Seja em que campo for: economia, meio ambiente, família, mobilidade, artes, pobreza e riqueza, ensino e aprendizagem, política, em qualquer campo, os sinais de degradação e o cheiro putrefato de decomposição se fazem notar. Diante desse quadro alguns se perguntam e projetam como pode vir a ser o futuro, como superar o momento presente e criar um novo, como administrar de modo a perpetuar e permitir a continuidade de nosso estilo de vida moderno e ocidental. Em quase todas as propostas tem-se a sensação de que se re-inventa a roda, ou que se gastam energia e recursos imensos na intenção de tentar faze-lo, ainda que de forma magicamente diferente. Tudo no entanto, num aparente esforço vão, ou numa fé cega de que os velhos deuses modernos (o pensamento científico, a tecnologia e a sociedade administrada) – uma santíssima trindade capenga – conseguirão dar conta do Leviatã que eles mesmos criaram, promovendo uma mágica reversão de si mesmos. Fé que se traduz em crença absurda e patética de que as coisas são assim e, por desconhecimento histórico, sempre serão.

Como conseqüência de tudo isso, vemos uma sociedade sem repouso, exausta, de gente cansada de trânsito, contas, correria e produção e que para buscar descanso se mete em mais diversão, correria, vaidade e viagens, em mais atividade e televisão, barulho e agitação, que por fim provocam mais cansaço.

No meio de tudo isso, salta um profeta - Jeremias - que nos chama a pensar:

“Ponham-se nas encruzilhadas e olhem; perguntem pelos caminhos antigos, perguntem pelo bom caminho. Sigam-no e acharão descanso. Mas vocês disseram: 'Não seguiremos!' ” Jer. 6:16

A tendência natural do ser humano é, diante do cansaço e do perigo, ao invés de colocar limites, tentar se anabolizar, ganhar mais energia, aumentar a velocidade e se fortalecer. Ao invés de menos, mais, ao invés da reflexão, diversão, ao invés da suavidade mais brutalidade.

A recomendação escrita pelo profeta nos chama a atenção para possíveis saídas da encruzilhada: Pare, olhe, pergunte, siga. Tudo ao contrário do que nos é proposto pelo sistema: continue, foque, proponha, lidere.

No momento em que vivemos, estou convencido, pelas palavras que leio e pelo exemplo da história, de que neste texto temos inclusive a orientação do onde buscar a orientação e saída: nas bases tradicionais que nos antecederam, nos avós, na memória retida entre aqueles que se mantiveram relativamente a parte da modernidade.

Enquanto nossa loucura conseguiu gerar riqueza antes inimaginável e destruição em escala inédita que nos colocaram na encruzilhada em menos de 60 anos de escalada global, e em 200 anos de progresso e Laizes Faire - de forma mais localizada no ocidente -, populações e culturas integradas com a criação e nas quais o tripé formado pelos princípios do acolhimento dos limites, da escolha pela renúncia e da concepção do sagrado são nutridos e mantidos tem se sustentado vivas, mesmo diante da agressão e da cooptação moderna, por muito mais tempo, por séculos e milênios, demonstrando possibilidades para as quais tentamos sem sucesso outras saídas que não consideram a possibilidade de abraçar estes princípios.

Sendo assim, em diálogo com o momento que vivemos e com as escrituras antigas, creio que podemos encontrar saídas, desistindo de inventar à frente, mas abrindo um diálogo com o passado, que ao mesmo que não nega as contribuições modernas, as relativiza e retira seu caráter de inevitabilidade.

O texto nos dá pistas do que fazer:

Ponha-se. Ou seja, pare. Sem parar o rítmo frenético, estaremos na situação de trocar um pneu com o carro andando. Se queremos ter um futuro, o primeiro passo é declarar uma moratória, que na impossibilidade de ser global, poderia ao menos ser pessoal ou comunitária.

Na encruzilhada. Além de parar é importante que nos permitamos dar conta da própria existência da encruzilhada. No nosso caso, deixar de negar o dilema, a crise e o momento e dar-se conta de estar sem rumo de um lado, mas da existência da possibilidade do outro. Ou seja, essa encruzilhada é formada pela consciência do mal existente, mas também da possibilidade da esperança, da imaginação de como poderia ser.

Como não temos ciência de como realizar esse poderia ser, somos chamados a mais um passo.

Perguntem. O passo fundamental é assumir nossa ignorância e postarmo-nos como aprendizes, como incertos, como não sabedores. A solução aparece para quem assume que tem um problema, não para quem o nega, e para aquele que diante do problema sabe humilhar-se a ponto de perguntar pela solução àqueles que o antecederam.

Pelos caminhos antigos. Quanto mais voltarmos, mais chances de nos posicionarmos adequadamente. Podemos voltar aos avós com humildade, à história do ocidente, às bases sociais tradicionais, ao conhecimento antigo. No entanto, o mais importante seja o caminho mais antigo, relatado no mais antigo texto do ocidente. É voltar ao caminho da relação de confiança na qual nós seres humanos confiávamos e Deus nos confiava o cuidado da criação. O caminho mais antigo, e há mais tempo abandonado, é o caminho da confiança. Confiança de que do jeito de Deus é melhor, de que Ele não está ai para tolher ou tornar nossa vida mais infeliz, de que Ele nos propôs uma parceria, onde nós vivemos e cuidamos e Ele nos mostra o que é bom, verdadeiro, justo e melhor, e nos avisa do que é falso, ruim, injusto e pior. Na prática isso se dá em conversa com os que nos antecederam, os que estão vivos ainda, e os que deixaram seus registros nos livros. Está em observá-los, em nutrir esquecidas artes e habilidades, em abrir mão de tudo que se pode, em prol do que é melhor. Em suma, é entender que o caminho para frente, é um caminho de volta.

Perguntem pelo Bom Caminho. Ser antigo não é o único critério. Houveram caminhos antigos que deram em nada, ou em desastre ou em destruição. Nem todo caminho antigo é bom porque é antigo. Nem todo conselho de avós, se justifica por ser do passado. Não basta ser velho, há de ser bom.

Mas qual seria esse caminho. Uma dica: talvez não seja nenhum dos que nós trilhamos, mas sim aquele trilhado por quem nos amou primeiro. Busque, ache e guarde como um tesouro.

Alguém que trilhou o bom caminho da confiança de forma completa foi Jesus. Ele se colocou não como mestre distante, mas como escravo sob o mesmo jugo que nós. Como tal Ele disse: Olhe! Aprenda de mim que sou manso e humilde. Coloquem sob si o jugo do mesmo modo que eu o coloco. E verão que em mim, acharão descanso. E você viverá. Assuma um coração aprendiz e veja o que acontece.

Hoje como naqueles tempos de “fim de feira” do Profeta Jeremias, chega-se à mesma triste conclusão: Mas vocês não querem!

Bem, se assim for, pouco se pode fazer, mas e se você desejar e se você tomar a decisão de parar na encruzilhada, talvez descubra que você seja um só. Nesse caso, fique com a frase que tenho usado, tanto baseado nas convicções que tenho quanto na paz oriunda de saber-se no caminho certo: “Eu sei que sou um só, e eu sei que um só pode muito pouco, mas o que um só pode fazer, isso eu farei”

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Dezenove Teses para trabalhar

Bem queridos, eis que aqui exponho 19 teses, abordadas originalmente pelo Professor Walter Brueggemann em uma conversa na All Souls Fellowship em 2004, e que transcrevo aqui com alguma adequação idiomática.

Estas teses ajudam a dar um todo a uma série de falas e modos de ser que venho trabalhando faz tempo. Assim resumem e poupam tempo.

Minha intenção é, nas próximas semanas, comentar uma por vez, discutir em pequenos textos e provocar mais e mais ambivalência, tensão e um pouco de crise, com o sentido explicito de permitir a emergência de sínteses melhores.

As teses tem como finalidade discutir o papel do ministério, não com nenhuma intenção reformista ou revolucionária, mas explicitamente de dar seqüência ao abandono de uma narrativa exaustjva, plana, cansativa e que só funciona em condições IDEAIS de temperatura e pressão, e que substitui uma narrativa muito mais interessante - que será o objeto de minha próxima postagem, bem como do próximo vídeo que produzirei na semana que vem.

Por enquanto, fiquem com o incômodo e com o desconforto destas teses, que vem logo após a citação de um escrito de meu autor predileto: Ivan Illich. Boa Leitura, e bom desconforto.


Nem a revolução nem a reforma podem, por fim, mudar a sociedade. Mais do que isso, deve-se contar uma nova e poderosa narrativa, uma tão persuasiva que varra para longe os velhos mitos e se torne a história predileta, uma tão inclusiva que junte todos os pedaços de nosso passado e nosso presente em um todo coerente, uma que mesmo seja capaz de jogar alguma luz sobre o futuro, de modo que nós possamos dar o próximo passo” - Ivan Illich


1. Todo mundo vive seguindo um script, ou melhor em português, um roteiro. O roteiro pode ser implícito ou explícito. Pode ser reconhecido ou não reconhecido, mas todo mundo tem um roteiro.


2. Nós somos “roteirizados”. Todos nós obtemos nossos roteiros através do processo de cuidado que recebemos, da formação e da socialização, e isso acontece conosco sem o nosso conhecimento.


3. A roteirização dominante na nossa sociedade é a de um roteiro de consumismo militante tecnológico e terapêutico, que nos socializa a todos, liberais ou conservadores.


4.Este roteiro (tecnológico, terapêutico e de consumismo militante) é transformado em lei através da publicidade, da propaganda e da ideologia, especialmente nas liturgias da televisão e promete fazer-nos sentir e viver mais seguros e tornar-nos mais felizes.


5. Esse roteiro falhou. Esse roteiro de consumismo militante não pode fazer-nos seguros e não pode fazer-nos felizes. Provavelmente somos a sociedade mais infeliz em todo o mundo.


6. Saúde para a nossa sociedade depende do desengajamento e do abandono de nosso compromisso com o consumismo militante. Esta é uma retirada e uma desistência à qual resistimos e sobre a qual somos profundamente ambíguos.

7. É a tarefa do ministério “desroteirizar” este roteiro de nosso meio. Isto é também, permitir às pessoas abandonar um mundo que já não existe e, que na verdade nunca existiu.Negrito


8. A tarefa de desroteirizar, renunciar e desengajar-se é realizada por uma constante, paciente e intencional articulação de um roteiro alternativo que pode nos dar a consciência da felicidade e da segurança. (com as quais nascemos: para maior compreensão ler Anthony de Mello: Awareness ou, em português, “despertando para o eu”)


9. O roteiro alternativo está enraizado na Bíblia e é promulgado através da tradição da Igreja. É a oferta de uma contra-narrativa, para contrariar o roteiro de consumismo militante baseado na fé no poder da tecnologia e da terapêutica.


10. Esse roteiro alternativo tem como sua maior característica, a sua personagem-chave - o Deus da Bíblia, a quem nomeamos como Pai, Filho e Espírito Santo.


11. Este roteiro não é monolítico, uni-dimensional ou sem rupturas e interrupções. É áspero e disjuntivo e incoerente. Em parte, é imperfeito, disjuntivo e incoerente, pois o mesmo foi elaborado ao longo do tempo por muitos grupos e comitês. Mas também é desigual e disjuntivo e incoerente, porque o personagem-chave é ilusivo e irrascível quanto a sua liberdade e sua soberania e na pouca revelação de si, e estou envergonhado de dizer, na violência – um enorme problema para nós.


12. A qualidade esfarrapada, disjuntiva e incoerente do contra-roteiro do qual testemunhamos, não pode ser suavizada ou tornada sem costuras ou remendos. [Penso que o escritor do Salmo 119 teria provavelmente gostado de torná-lo sem costura]. Porque quando nós fazemos isso, o roteiro que recebemos se tornar plano e domesticado. [Esta é a minha polêmica contra a teologia sistemática]. O roteiro se torna plano, domesticado e torna-se um fraco eco do roteiro dominante do consumismo militante baseado na fé no ponto de vista tecnológico e terapêutico da sociedade. Enquanto o roteiro dominante de consumismo tecnológico militante é todo sobre certezas, privilégios e direitos, este contra-roteiro não é sobre certeza, privilégio e direito. Assim, cuidados devem ser tomados para deixar esse roteiro ser o que é, o que implica deixar Deus ser o Deus que é, mesmo o Deus irascível que é, se for o caso.


13. O aspecto descontinuo e disjuntivo do personagem do contra-roteiro do qual testemunhamos, acaba por estimular seus seguidores a brigarem entre si - liberais e conservadores - de forma que a principal reivindicação da roteiro acaba prejudicada e assim também debilitar a atenção no foco do roteiro.


14. O ponto de entrada na contra-roteiro é chamado de batismo. Pelo que dizemos nas antigas liturgias: "Você renuncia ao roteiro dominante?"


15. O cuidado e o cultivo, a formação e a socialização para viver dentro deste contra-roteiro, com este personagem ilusivo, incerto e irascível é o trabalho do ministério. Nós fazemos o trabalho de cuidar, de formar e socializar através das práticas da pregação, da liturgia,da educação,da ação social,da espiritualidade, e de atos de vizinhança de todos os tipos.


16. A maioria de nós somos ambíguos com relação ao roteiro, aqueles de nós a quem ministramos e, ouso dizer, aqueles de nós que ministramos. A maioria de nós não estamos nos locais mais profundos, esperando para poder escolher entre o roteiro dominante e o contra-roteiro. A maioria de nós quando estamos nos lugares mais profundos somos vacilantes e balbuciantes em nossa ambivalência.


17. Esta ambivalência entre os roteiros é justamente a principal jurisdição para o Espírito. De tal forma que “ministério” é nomear e aumentar a ambivalência que liberais e conservadores têm em comum, que põe as pessoas em crise e que, consequentemente, invoca resistência e hostilidade.


18. Ministério é gerenciar essa ambivalência, que é igualmente presente entre liberais e conservadores, de maneira original mas cheios de fidelidade de modo a permitir a desistência do velho de roteiro e o acolhimento do novo roteiro.


19. O trabalho do ministério é central, crucial e indispensável em nossa sociedade justamente porque não há ninguém [há de se ver se isso não é um exagero, mas fiquemos por aqui por enquanto], não existe outra coisa, exceto a igreja e a sinagoga, para nomear e evocar a ambivalência e, também, administrar o caminho através dela. Penso muitas vezes, ao ver o dia-a-dia de coisas mundanas que os ministros têm de fazer, e eu penso: meu Deus, o que aconteceria se você retirasse todos os ministros?!? Assim, o papel do ministério é tão urgente quanto é extraordinário e difícil.


quarta-feira, 13 de maio de 2009

Lealdade.... a Quem?


Uma das coisas que tenho como fundamentais em minha vida é a compreensão do que vem a ser isto de tornar-se um seguidor de Jesus. A mudança que está implícita nesta decisão não é de natureza filosófica ou mesmo religiosa e reduzir este processo a isso - ainda que estes componentes até possam existir como parte - é perder o ponto central desse seguimento.

Tornar-se um seguidor de Jesus tem a ver com algo muito mais implicador e comprometedor do que uma mera mudança religiosa, ou assunção de uma nova filosofia de vida. A mudança que se dá, e à qual somos convidados e convidadas por Jesus, é traduzida por um outro definidor: uma transferência de plataforma de lealdade, uma mudança para além do comportamento ou da crença, uma ruptura com lealdades assumidas previamente e o comprometimento da vida com outra lealdade, que começa no coração, a partir dali.

Esse processo, por esta definição, não acontece de uma vez por todas, mas passa a ter um caráter diário e dinâmico, seja por não estar definido por nenhum conteúdo pré-determinado e consolidado em uma série de regras escritas, seja por permitir o aprofundamento constante e o conhecimento em níveis cada vez mais simples e mais complexos ou seja por ser fruto de uma relação e não de uma declaração.

Quando me refiro à lealdade podemos ver que esta característica nos é requerida por vários dos atores com os quais pisamos este palco da vida. No tempo presente, os mais óbvios são o Estado e o Mercado,

que vem se degladiando de forma crescente pela hegemonia das relações de lealdade em nosso coração nos últimos 500 anos. No entanto, laços de família, de cosangüinidade, raciais, sexuais, profissionais, empresariais, religiosos, filosóficos, políticos e funcionais jogam este mesmo jogo de busca de hegemonia sobre noss vida, normalmente em papéis mais secundários, ainda que presentes e bem visíveis em nosso dia-a-dia. Tudo luta pela lealdade de nosso coração, e é fácil verificar onde está a de cada um, pela observação de nossas atitudes, alianças e gasto de tempo. Basta um pouco de honestidade para se olhar no espelho.

No caso do Estado, a pátria, invenção muito recente, reclama nossa lealdade e a capacidade de dedicarmo-nos a “deveres cívicos” e “direitos reconhecidos”, como o de matar,prender, taxar, votar, denunciar e se deixar controlar por leis nem sempre do interesse das pessoas ou das relações. O mercado , hoje o usurpador mais presente, exige de nossa vida horas, dias e anos de preparação para servi-lo, impõe sobre nós valores que são destruidores de pessoas e de convívios através da competitividade, da velocidade e das poucas horas de parada. Estabelece relações permitidas, proibidas, interessantes e desinteressantes, destrói famílias, usurpa maternidades e corrói o companheirismo.

Assim como no antigo Império Romano, ambos e todos os agentes citados acima admitem qualquer postura que um indivíduo tome, desde que essas não comprometam o central para para o sistema; aceitam qualquer fé, desde que não interfira na prática de ninguém nem questionem os sacrossantos princípios como o consumo, o crédito, a delegação representativa, a subserviência a normas impostas, a escolarização compulsória, a apatia diante do mal.

Assim como no  já citado Império Romano, aparece o Cristo que diz ontem como hoje: “Me segue”. E com essa simples frase, confronta o sistema, desafia a lealdade incontestável, relativiza o absoluto. Ao nos chamar para se tornar seus seguidores, copiar seus passos e assumir sua vida, chama também a uma nova lealdade que implica em mudanças de hábito, modo de pensar e de agir, e nos coloca em outro campo, oposto e alternativo ao que ai está.

Como forma de exemplificar o que significa isso para mim, costumo responder aos questionamentos que me fazem sobre porque faço ou deixo de fazer determinadas coisas com uma frase comum: “Porque no meu país é assim que a gente faz”. 

Assim, eu prefiro a bicicleta, por que no meu país ninguém usa motor a combustão para se locomover, lá as pessoas andam, e se cumprimentam, adoram um papo e passeiam todo fim de tarde no jardim com o Rei do lugar. Além disso, lá a gente não come bichos, pois o leão e o cordeiro são amigos e brincam um com o outro, e mesmo as crianças de colo podem brincar com texugos e outros animais aqui chamados de perigosos, e todos nós cultivamos o princípio de não derramar sangue e preferir buscar nas plantas nossa vida, nossa nutrição e saúde. Lá no meu país, as portas nunca se fecham, ficam sempre abertas, como diria Marisa Monte, pra sorte entrar. Comemos pão e vinho para celebrar numa mesa enorme a alegria da vida que tem sempre a vitória final.

Lá no meu país, assim como em Pasargada, somos todos amigos do Rei, que assim sendo nos chama de irmãos. Sentamos debaixo de uma árvore Viva e lá batemos papos de sabedoria sobre o bem, esquecendo do mal. E também lá não se vota pois o sistema é uma monarquia dirigida por juízes que ganharam esta função por serem retos, comprometidos com a verdade e a integridade, e na verdade, todos no meu país exercem tal função.

Lá no meu país, as ruas são de ouro e as maçanetas são de diamante, e ... não, não pense que é frescura de burguês, é por que lá essas coisas não são valores, só servem mesmo pra asfaltar e para complementar as casas que guardam nosso maior, único e verdadeiro tesouro: As pessoas.

Lá no meu país, ao qual sou completamente leal, não tem nenhum templo, por que a presença de Deus está em todos os lugares, e o verdadeiro lugar de adoração se constrói a cada encontro de corações leais e sinceros ao nosso Deus. A vida diária é um culto só, uma celebração de vida, pão fresco e vinho.

Ainda lá no meu país, ninguém toma antidepressivo, pois que todas as lágrimas são enxugadas. Também lá, os velhos tem um lugar especial, e nós os chamamos de anciãos. Eles nos dirigem em nossas atividades e relações com nosso Rei. Outra coisa é que os mais desprezados nos mais diversos países, emigraram para lá – alguns prematuramente - todos os mártires, todas as mulheres que sofrem injustiça, todas as crianças usurpadas, e lá encontraram plena cidadania, sendo que a cada um são dadas vestes brancas e um lugar de destaque.

Lá no meu país... lá onde está o meu tesouro... lá onde mora minha lealdade.

E ai, enquanto estou aqui neste país, ajo como embaixador do meu, cumprindo minha vida de um jeitão que aqui acham esquisito, e apesar de limitado e submetido a normas locais, sempre que pressionado, sei a quem pertence minha lealdade, então coloco limites. Tento não incomodar muito, e viver em paz, fazendo tudo o que não rompa com os princípios a que sou leal no meu país. E à medida que vou percebendo que algo deste país aqui me faz agir de forma diferente do que agiria no meu país, busco mudar o modo de pensar, re-aprender como se faz lá e daí mudo, inverto e saio por ai seguindo o jeitão do meu país.

De vez em quando pareço esquisito, como é comum com aqueles que falam outro sotaque, usam roupas típicas ou comem comidas de suas terras. Mas na medida que outros cidadãos de lá se encontram aqui, a gente se reúne em uma espécie de CTG à nossa moda, onde celebramos nossas tradições e identidade nacional.

E aguardamos... até o dia em que, ou nosso Rei em visita por aqui nos chamar de volta ou vier retomar as partes que lhe pertencem e que lhe foram usurpadas.

Até lá permaneço leal a Ele, buscando segui-lo e me arriscando a ser tomado por criminoso ou refratário cada vez que questiono, desobedeço a leis ou valores locais ou faço algo que só faz sentido mesmo em país como o meu - e nenhum aqui. Mandado pelo meu Rei, a quem celebro,  espero enquanto nesse exílio longo, mas cheio de compromissos com o futuro, o dia de viver para sempre por lá. 

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Nossos filhos oferecidos em holocausto

O texto do lecionário de hoje me fez pensar (clique aqui se quiser ler os textos).

Para quem não conhece muito das tradições do Oriente médio antigo, em especial da região onde hoje lutam Israel e Palestina, pode soar estranho e nojento pensar que algumas das religiões de cerca de 3000 anos atrás incluíam oferecer os filhos pequenos em sacrifícios de sangue, ou queimados até as cinzas, em cultos a deuses estranhos e com estranhos nomes como Baal ou Moloque.

Estes deuses ofereciam em troca prosperidade, sucesso, sossego e vida abundante, além de segurança contra intempéries e inimigos, mudanças na economia e na política, alterações do status social. A luta por manter o grupo de valores, o sistema de produção, a corrupção das autoridades e a manutenção de um determinado grupo político no poder era feroz, e implicava em intrincados jogos de sedução e poder.

O custo liturgico disto eram os bebês sacrificados, os filhos e filhas emulados e destroçados. Calava-se diante deste absurdo, porque no fim das contas não era uma questão religiosa, mas sobretudo de manutenção do status quo, das posições sociais, dos benefícios auferidos. A religião era motor e conseqüência, ao mesmo tempo, mas era só religião.

Em função deste sistema iníquo riquezas eram mantidas, comércio era feito, trocas realizadas, e a opressão dos pobres pelos ricos mantida inalterada. Mas um dia um profeta com um vaso de barro avisou: ACABOU. Deus esgotou a paciência, e não vai ficar pedra sobre pedra.

No texto do Apocalipse do lecionário de hoje, temos descrita a queda da grande cidade dominadora sobre o resto do mundo (lugar hoje ocupado por você sabe quem). Cidade com a qual todos negociam, e que garante a prosperidade de todos. E no fim da lista dos produtos comercializados por ela um recurso impensável:  a venda de gente, ou como se chama hoje em dia “recursos humanos”. Filhos e filhas, certamente, de alguém.

Ao olhar para nossa sociedade em crise, a luta por não se alterar nada, a insegurança tomando conta das pessoas, a entrega passiva de nossa vida no altar da adoração do mercado e do lucro, da manutenção de nosso estilo de vida insustentável, a celebração do consumo e do dinheiro, para mim se torna muito difícil não traçar o paralelo.

Hoje nossos filhos e filhas são queimados em um sistema de educação pasteurizado e cerceador da liberdade, que a todos transforma em uma massa de iguais, onde a diferença é terapeutizada para que volte a ser parte do bolo podre de consumidores passivos, onde tudo é o dinheiro que faz e manda e onde eles são treinados para servirem, adorarem, obedecerem e pertencerem ao mercado, nele se encaixarem e por fim acabarem enfermos e estressados e consumidos pelo mesmo mercado. Nossos filhos perdem seus pais, os pais não tem tempo e nós os preparamos para serem mercadorias nas mãos do sistema de troca  e que troca tudo por dinheiro.

ASSIM OS ENTREGAMOS NO MESMO TIPO DE HOLOCAUSTO, MENOS SANGRENTO POR CERTO, MAS IGUALMENTE CONSUMIDOR DE SUAS VIDAS.

Mas se ouvirmos as escrituras vemos ali um aviso semelhante ao que deu Jeremias com o vaso de barro: tudo isso é frágil, é nada e será quebrado.

Não quero escrever muito hoje, mas fico com o consolo do Salmo: Confiem em Deus, desconfiem do sistema, do jeitinho fácil, da caminhada comum a todos, nos bens roubados, dos outros ou da natureza, e nem tampouco confiem nas riquezas, aquelas que temos e as que podemos vir a ganhar no sistema. Só em Deus e com Deus está a fidelidade, e é certo que Ele retribuirá a cada um conforme seu procedimento.