quarta-feira, 15 de julho de 2009

O futuro está no passado


Vivemos uma encruzilhada de perplexidade e de pasmo nesse momento da história do ocidente, ou de nosso ocidentalizado planeta. Chegamos mais uma vez, dessa vez de modo mais intenso que nas demais, ao momento de seguir em frente e decidir por uma direção.

Isso não é novo na história humana, muitas vezes já estivemos ai.

Várias dessas vezes, civilizações, povos e nações tomaram o rumo errado que acabou em auto-destruição tragédia, morte e extinção. Culturas se perderam e hoje seus vestígios são motivo de visitas a museus e sítios arqueológicos. Outras, infelizmente em menor número, tomaram direções por vezes menos glamourosas, menos evidentes, mas que lhes permitiu continuar. E mesmo dentro de histórias onde uma segunda chance foi desperdiçada, vemos momentos em que anteriormente se soube mudar a maneira de pensar e mudar a rota de colisão.

Seja em que campo for: economia, meio ambiente, família, mobilidade, artes, pobreza e riqueza, ensino e aprendizagem, política, em qualquer campo, os sinais de degradação e o cheiro putrefato de decomposição se fazem notar. Diante desse quadro alguns se perguntam e projetam como pode vir a ser o futuro, como superar o momento presente e criar um novo, como administrar de modo a perpetuar e permitir a continuidade de nosso estilo de vida moderno e ocidental. Em quase todas as propostas tem-se a sensação de que se re-inventa a roda, ou que se gastam energia e recursos imensos na intenção de tentar faze-lo, ainda que de forma magicamente diferente. Tudo no entanto, num aparente esforço vão, ou numa fé cega de que os velhos deuses modernos (o pensamento científico, a tecnologia e a sociedade administrada) – uma santíssima trindade capenga – conseguirão dar conta do Leviatã que eles mesmos criaram, promovendo uma mágica reversão de si mesmos. Fé que se traduz em crença absurda e patética de que as coisas são assim e, por desconhecimento histórico, sempre serão.

Como conseqüência de tudo isso, vemos uma sociedade sem repouso, exausta, de gente cansada de trânsito, contas, correria e produção e que para buscar descanso se mete em mais diversão, correria, vaidade e viagens, em mais atividade e televisão, barulho e agitação, que por fim provocam mais cansaço.

No meio de tudo isso, salta um profeta - Jeremias - que nos chama a pensar:

“Ponham-se nas encruzilhadas e olhem; perguntem pelos caminhos antigos, perguntem pelo bom caminho. Sigam-no e acharão descanso. Mas vocês disseram: 'Não seguiremos!' ” Jer. 6:16

A tendência natural do ser humano é, diante do cansaço e do perigo, ao invés de colocar limites, tentar se anabolizar, ganhar mais energia, aumentar a velocidade e se fortalecer. Ao invés de menos, mais, ao invés da reflexão, diversão, ao invés da suavidade mais brutalidade.

A recomendação escrita pelo profeta nos chama a atenção para possíveis saídas da encruzilhada: Pare, olhe, pergunte, siga. Tudo ao contrário do que nos é proposto pelo sistema: continue, foque, proponha, lidere.

No momento em que vivemos, estou convencido, pelas palavras que leio e pelo exemplo da história, de que neste texto temos inclusive a orientação do onde buscar a orientação e saída: nas bases tradicionais que nos antecederam, nos avós, na memória retida entre aqueles que se mantiveram relativamente a parte da modernidade.

Enquanto nossa loucura conseguiu gerar riqueza antes inimaginável e destruição em escala inédita que nos colocaram na encruzilhada em menos de 60 anos de escalada global, e em 200 anos de progresso e Laizes Faire - de forma mais localizada no ocidente -, populações e culturas integradas com a criação e nas quais o tripé formado pelos princípios do acolhimento dos limites, da escolha pela renúncia e da concepção do sagrado são nutridos e mantidos tem se sustentado vivas, mesmo diante da agressão e da cooptação moderna, por muito mais tempo, por séculos e milênios, demonstrando possibilidades para as quais tentamos sem sucesso outras saídas que não consideram a possibilidade de abraçar estes princípios.

Sendo assim, em diálogo com o momento que vivemos e com as escrituras antigas, creio que podemos encontrar saídas, desistindo de inventar à frente, mas abrindo um diálogo com o passado, que ao mesmo que não nega as contribuições modernas, as relativiza e retira seu caráter de inevitabilidade.

O texto nos dá pistas do que fazer:

Ponha-se. Ou seja, pare. Sem parar o rítmo frenético, estaremos na situação de trocar um pneu com o carro andando. Se queremos ter um futuro, o primeiro passo é declarar uma moratória, que na impossibilidade de ser global, poderia ao menos ser pessoal ou comunitária.

Na encruzilhada. Além de parar é importante que nos permitamos dar conta da própria existência da encruzilhada. No nosso caso, deixar de negar o dilema, a crise e o momento e dar-se conta de estar sem rumo de um lado, mas da existência da possibilidade do outro. Ou seja, essa encruzilhada é formada pela consciência do mal existente, mas também da possibilidade da esperança, da imaginação de como poderia ser.

Como não temos ciência de como realizar esse poderia ser, somos chamados a mais um passo.

Perguntem. O passo fundamental é assumir nossa ignorância e postarmo-nos como aprendizes, como incertos, como não sabedores. A solução aparece para quem assume que tem um problema, não para quem o nega, e para aquele que diante do problema sabe humilhar-se a ponto de perguntar pela solução àqueles que o antecederam.

Pelos caminhos antigos. Quanto mais voltarmos, mais chances de nos posicionarmos adequadamente. Podemos voltar aos avós com humildade, à história do ocidente, às bases sociais tradicionais, ao conhecimento antigo. No entanto, o mais importante seja o caminho mais antigo, relatado no mais antigo texto do ocidente. É voltar ao caminho da relação de confiança na qual nós seres humanos confiávamos e Deus nos confiava o cuidado da criação. O caminho mais antigo, e há mais tempo abandonado, é o caminho da confiança. Confiança de que do jeito de Deus é melhor, de que Ele não está ai para tolher ou tornar nossa vida mais infeliz, de que Ele nos propôs uma parceria, onde nós vivemos e cuidamos e Ele nos mostra o que é bom, verdadeiro, justo e melhor, e nos avisa do que é falso, ruim, injusto e pior. Na prática isso se dá em conversa com os que nos antecederam, os que estão vivos ainda, e os que deixaram seus registros nos livros. Está em observá-los, em nutrir esquecidas artes e habilidades, em abrir mão de tudo que se pode, em prol do que é melhor. Em suma, é entender que o caminho para frente, é um caminho de volta.

Perguntem pelo Bom Caminho. Ser antigo não é o único critério. Houveram caminhos antigos que deram em nada, ou em desastre ou em destruição. Nem todo caminho antigo é bom porque é antigo. Nem todo conselho de avós, se justifica por ser do passado. Não basta ser velho, há de ser bom.

Mas qual seria esse caminho. Uma dica: talvez não seja nenhum dos que nós trilhamos, mas sim aquele trilhado por quem nos amou primeiro. Busque, ache e guarde como um tesouro.

Alguém que trilhou o bom caminho da confiança de forma completa foi Jesus. Ele se colocou não como mestre distante, mas como escravo sob o mesmo jugo que nós. Como tal Ele disse: Olhe! Aprenda de mim que sou manso e humilde. Coloquem sob si o jugo do mesmo modo que eu o coloco. E verão que em mim, acharão descanso. E você viverá. Assuma um coração aprendiz e veja o que acontece.

Hoje como naqueles tempos de “fim de feira” do Profeta Jeremias, chega-se à mesma triste conclusão: Mas vocês não querem!

Bem, se assim for, pouco se pode fazer, mas e se você desejar e se você tomar a decisão de parar na encruzilhada, talvez descubra que você seja um só. Nesse caso, fique com a frase que tenho usado, tanto baseado nas convicções que tenho quanto na paz oriunda de saber-se no caminho certo: “Eu sei que sou um só, e eu sei que um só pode muito pouco, mas o que um só pode fazer, isso eu farei”

12 comentários:

Asbury disse...

Claudio, como sempre inspirador! Profundo, direto e claro.

Samuel Monteiro disse...

Sinto-me desafiado..mas confesso que falta em mim o que sobra em você: "um forte entusiasmo".

E na verdade o que me falta é o meu ponto de partida para a busca do que sei que devo ser. Minha oração é a de um aprendiz: eu quero !!

Um bjo.

Homero disse...

Falando em futuro, apesar de muitos indícios que apontam para o futuro com incertezas preocupantes ou "certezas" gravíssimas, como pode ser conferido em: http://www.nossofuturoroubado.com.br/

De fato, estou diante da possibilidade diária e histórica de escolher olhar para o passado e de lá vislumbrar o futuro ou de não olhar para o presente, não parar e acelerar rumo ao futuro. Que pode ser uma "roubada".

Carlos Tarlatana disse...
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Carlos Tarlatana disse...
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Carlos Tarlatana disse...
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Carlos Tarlatana disse...

Parafraseando o autor do momento Cláudio, todos querem o progresso, isto é, nos aproximar do lugar que gostaríamos de estar. Se errarmos o caminho, progredir é dar meia volta, retroceder, admitir o erro e recomeçar. Esse movimento a toda velocidade para traz, que me faz entender o sentido de “arrepender-se” parece ser a única forma de sairmos do buraco em que caímos. Depondo nossas armas, desaprendendo toda vontade própria e centralismo que temos exercitado sobre nós mesmos. Morrer. E assim, deixar germinar a nova vida que começou em Cristo. Hoje começo a entender, que, o primeiro passo é atrasar meu relógio, ou joga-lo fora. Parar a locomotiva. Voltar a estação para buscar o Maquinista. Reaprender. Adiante, basta pisar nas pegadas que Deus vai deixando a nossa frente. Tenho prazer em lê-lo, quando percebo que toda vez alguma coisa enguiça nas excelentes idealizações humanas. Ora no caminho errado, ora com o combustível errado. E ânimo quando demonstra que existem opções meio a tanta maldade e destruição, não as nossas, por certo, mais daquele que criou a locomotiva, os trilhos e as pontes. “Não pensa que Deus nos amará porque sejamos bons, mas que Deus nos fará bons porque Ele nos ama; como o telhado de uma estufa para plantas não atrai o sol porque é brilhante, mas torna-se brilhante porque nele brilha o sol.” C. S Lewis.

Rafael.

ESCAMBO MT disse...

Suas palavras apenas afirmam sua vida, meu amigo...

Obrigado por ser referência,

Beda

Tato disse...

Dureza é que como você disse, Claudio, grande parte dos nossos nem ao menos enxerga a encruzilhada.

Se ao menos se dessem conta dos rumos que tomamos e de que outra realidade é possível e ainda que, por mais inacreditável que a princípio lhes pareça, "menos" pode ser "mais", creio que muita coisa mudaria.

Mas como estava comentando esses dias com nosso amigo Brabo, eu mesmo estou afundado nisso tudo até o pescoço. Ainda tenho um longo caminho a percorrer.


Abraço.

Unknown disse...

Esse seu texto me trouxe na memória a seguinte música:

Ando devagar porque já tive pressa
Levo esse sorriso porque já chorei demais
Hoje me sinto mais forte, mais feliz quem sabe
Só levo a certeza de que muito pouco eu sei
Eu nada sei

Abraço. Daniel Seifert

ALEXANDRE disse...

Sua reflexão me inspira e anima a viver uma vida cada vez mais na mão de Deus.
Apesar do meu inclausuramento sinto-me renovado com a leitura do lecionário e com a sua reflexão meu amigo.
Espero poder perguntar sempre, aprender sempre, pois não sei onde Deus está nos levando mas, apesar da apreenção, sinto paz e quero saber escolher o melhor caminho nesta incrusilhada.
Um grande abraço
Alexandre

Maria cristina disse...

Claudio
Seus textos - os orais e os escritos - sempre me emocionam, ajudam a refletir, a clarear o caminho e principalmente a ter mais confiança e mais certeza nas escolhas que tenho feito .Encruzilhadas, tenho a sensação que já estive diversas vezes diante de uma.Dúvidas e hesitação:inúmeras.Esse caminho que você aponta não é o mais fácil,mas nunca gostei de coisas fáceis...Obrigado por tudo !
Grande abraço.
Cristina